Inspeção da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizada em março deste ano encontrou indícios de direcionamento na licitação para construção do prédio da lâmina central da sede do Tribunal de Justiça do Rio para a empresa Delta Construções S.A.
Relatório da inspeção questiona a celebração de cinco aditivos que elevaram o preço final da obra em 23,63%, apesar de a Delta ter sido a responsável pela elaboração do projeto executivo da construção. Dos R$ 141,4 milhões previstos, o contrato — assinado em 1.º de julho de 2010 — chegou a R$ 174,8 milhões. Além disso, o prazo da obra passou de 390 dias para 515 dias.
“Os requisitos de qualificação foram tão limitadores a ponto de conduzir o certame para a única licitante presente: a empresa Delta Construções S.A. A própria Delta foi incumbida de desenvolver o projeto executivo e mesmo assim foram celebrados aditivos em porcentual superior a 23% sem que houvesse acréscimo de obra. Os acréscimos foram de matérias e serviços”, diz o relatório da Corregedoria do CNJ, em sua página 93, publicado em 6 de setembro.
O texto continua: “Há de se entender que se houvesse divergência de quantitativos de materiais e serviços entre o projeto básico e o executivo teriam de ser vistos de uma vez na confrontação dos dois projetos”. A inspeção preventiva no TJ-RJ foi feita entre 26 e 30 de março de 2012.
O relatório questiona ainda a suspensão de licitação anterior para a mesma obra, na qual a vencedora foi a empresa Paulitec Construções Ltda.
“Por razões ainda não bem explicadas, “não houve formalização de termo de contrato, fato que culminou na instauração de procedimento apuratório”, segundo informações prestadas ao Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ).
O TJ-RJ deu andamento de imediato à licitação 097/2010, sem a devida chancela da assessoria jurídica sob a alegação de tratar-se de edital igual ao anterior. Pouco provável de ser, devido ao injustificado nível de exigências contido no novo instrumento convocatório”, escreveram os técnicos do CNJ.
SONEGAÇÃO FISCAL — Ainda de acordo com o documento, há indícios de sonegação fiscal. O edital 052/2010 incluiu a obra no Regime Especial de Incentivos para o Desenvolvimento da Infraestrutura (Reidi), instituído pela Lei 11.488/2007. O Reidi isenta de pagamento de PIS e Cofins (que juntos chegam a 9,25%) obras nos setores de transportes, portos, energia, saneamento básico e irrigação.
“Notoriamente a obra do TJ-RJ não se enquadra em nenhuma delas. Dessa maneira, o faturamento da obra de construção do prédio da lâmina central do complexo do foro central da Comarca da Capital deve ocorrer normalmente com o pagamento de todos os tributos, o que não está ocorrendo. (…) Assim, os tributos PIS e Cofins são sonegados e a contratada (Delta) utiliza indevidamente o benefício do Reidi”, diz o relatório.
O contrato 003/533/2010 e o primeiro aditivo foram assinados durante a presidência do desembargador Luiz Zveiter no TJ-RJ. Atualmente, ele é presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio (TRE-RJ). Os outros quatro aditivos foram assinados na atual gestão do TJ, do desembargador Manoel Alberto Rebêlo dos Santos. Os magistrados negam as irregularidades.
Desde que a Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, revelou as relações entre o contraventor Carlinhos Cachoeira e a Delta, em fevereiro, a empresa perdeu vários contratos com órgãos públicos. No Rio, a construtora abandonou a obra de reforma do Maracanã para a Copa de 2014 e o consórcio para construção do TransCarioca, corredor exclusivo de ônibus que vai ligar o Aeroporto Internacional Tom Jobim à Barra da Tijuca.
TRIBUNAL E CONSTRUTORA CONTESTAM CORREGEDORIA — O desembargador Luiz Zveiter afirmou que todas as licitações feitas em sua gestão foram aprovadas pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ). “Não sei os parâmetros que os técnicos do Conselho Nacional de Justiça usaram. Eu era ordenador de despesas, não sou técnico. Mas todas as minhas licitações eram submetidas ao TCE antes e depois de serem publicadas. Não tem nada de irregular nas minhas contas.”
Em nota, a Delta informou que “todas as exigências contidas no edital estavam ali colocadas e valiam para o conjunto dos concorrentes”.
Em nota, a empresa negou ter sonegado impostos. “Não foi a Delta Construções, empresa contratada, quem incluiu a obra do TJ-RJ no Reidi — a empresa nem sequer tem poderes para tal. (…) Empresas que têm o setor público como clientes, e este é o caso da Delta, jamais podem figurar em listas e relatórios como detentoras de lacunas fiscais.” A construtora diz que entregou a obra em 27 de maio de 2012.
Já o TJ-RJ negou irregularidades na licitação em nota. “Não existiu direcionamento nenhum, muito pelo contrário, o edital de licitação foi previamente conhecido e aprovado pelo TCE”, afirmou. “Na época que o primeiro edital foi lançado ainda não tinha sido publicada a Resolução nº. 114/09 do CNJ e todas as licitações do Tribunal constam apenas com o projeto básico, sendo costume e regra a imputação da elaboração do projeto executivo à empresa vencedora do certame. Esta prática é aprovada pelo TCE-RJ e pelo TCU, que nunca questionou a inexistência de projeto executivo nas licitações do TJ-RJ. (…) A elaboração do projeto executivo concomitantemente à execução da obra é permitido pela Lei 8.666/93.”
Em relação aos aditamentos, o TJ-RJ informou que todos “foram decorrentes de alterações necessárias na estrutura da obra prevista pelo projeto básico”. Disse ainda que todos eles “estão comprovados dentro do processo licitatório”.
O tribunal acrescentou que a primeira licitação da obra foi revogada após a empresa vencedora se negar a assinar o contrato, “motivo pelo qual foi instaurado um procedimento apuratório contra a mesma e renovado o edital de licitação, repetindo os mesmos termos do anterior”. O TJ também negou a ocorrência de fraude fiscal, afirmando que todos os impostos foram pagos. (informações do jornal O Estado de S. Paulo)