Representantes máximos da lei, os magistrados têm o poder de julgar do cidadão comum ao presidente da República. Mas cortar na própria carne está longe da realidade do judiciário. Casos de excessos praticados pelos homens de toga chamam a atenção, mas muitos não vão adiante.
Levantamento feito pelo DIA revela que o Órgão Especial do Tribunal de Justiça recebeu 47 pedidos de abertura de processos administrativos disciplinares contra magistrados entre 2010 e 2015. Apenas oito resultaram em punição: duas advertências, quatro censuras, uma disponibilidade compulsória e uma aposentadoria compulsória.
Dezenove das 47 denúncias sequer foram aceitas, e ainda não há decisão sobre duas. Dos 26 processos abertos, 14 foram arquivados e quatro estão em andamento.
Segundo a Corregedoria-Geral do Tribunal, nos últimos três anos foram abertas 1.254 representações e 98 reclamações — notícia de fato irregular durante o processo— contra magistrados. O resultado pode ser do arquivamento até a demissão. A corregedora Maria Augusta Vaz Monteiro de Figueiredo defende que o número de reclamações é exagerado.
“Aproximadamente 90% dizem respeito a excesso de prazo no trâmite processual, traduzindo insatisfação com a demora nos processos. Mas, em geral, não têm relação com atos infracionais de magistrados e sim morosidade cartorária, ante a grande carência de funcionários, enorme número de processos”, afirma.
A interpretação dos fatos é bem diferente para o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Felipe Santa Cruz. “Nunca se puniu, o que transforma os juízes em verdadeiros homens-bomba. Isso só protege os maus juízes e prejudica a totalidade dos magistrados”, contesta Santa Cruz. A crítica ganha eco no Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário (Sindjustiça-RJ).
Para Alzimar Andrade Silva, um dos diretores, o corporativismo é o maior obstáculo para reprimir os excessos. “Não importa a denúncia, os casos são arquivados. A proteção começa no Diário Oficial. Quando juiz ou magistrado é investigado, o nome não é publicado. Mas se for servidor acontece o contrário, a denúncia e o nome são discriminados”, protesta.
A entidade denunciou à Corregedoria um juiz acusado de assédio sexual e moral em duas comarcas no interior do estado. Uma das estagiárias revelou que o magistrado comentava até sobre roupas íntimas que ela usava. A investigação gerou polêmica. O sindicato alega que o juiz recebeu informações sobre o caso, procurou as supostas vítimas, o que levou a entidade a representar contra a corregedora Maria Augusta no Órgão Especial.
A magistrada rebate as críticas. “No Brasil, há aproximadamente 15 mil magistrados. Então, proporcionalmente, não são muitos excessos. Talvez este ‘pensamento social’ aconteça em razão de se dar maior destaque aos casos negativos, que, raramente são acompanhados até o julgamento”, alega Maria Augusta. Ressalta que, ano passado, entraram em tramitação 10.078.026 processos e que os juízes do Rio são considerados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) os mais produtivos do país. Em média, 3.365 sentenças foram proferidas por cada um em 2013. A partir de hoje, O DIA publica série de três capítulos sobre o assunto. (informações da coluna Justiça e Cidadania de O Dia)