Uma reunião de quase uma hora selou o clima de guerra entre o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, e dirigentes de associações de magistrados. Barbosa disse que a criação de novos Tribunais Regionais Federais foi aprovada no Congresso Nacional de forma “sorrateira”, com o apoio das associações, e apostou que os tribunais serão construídos perto de praias. O ministro afirmou que as entidades não representam a nação, mas seus interesses corporativos. No encontro, Barbosa pediu para um dos juízes “abaixar o tom de voz” e só se manifestar quando ele autorizasse.
“Esses tribunais vão ser criados em resorts, em alguma grande praia!”, disse.
A reunião foi aberta à imprensa. Estavam presentes integrantes de Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Associação de Juízes Federais do Brasil (Ajufe), e Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra). Barbosa reclamou que o Congresso aprovou os tribunais sem ouvir órgãos interessados:
“Mais uma vez, toma-se uma decisão de peso no país sem ouvir o CNJ. Ou seja, à base de cochichos. Os senadores e deputados foram induzidos a erro. Porque ninguém colocou nada no papel.”
Um dos juízes disse que a Ajufe acompanhou o processo ao longo dos 13 anos de tramitação. Barbosa não gostou: “A Constituição não dá poderes à Ajufe. Isso não faz parte das exigências constitucionais. Não confunda a legitimidade que o senhor tem enquanto representante sindical com a legitimidade dos órgãos do Estado. Eu estou dizendo é que órgãos importantes do Estado não se pronunciaram sobre o projeto. Pelo que vejo, vocês participaram de forma sorrateira na aprovação”.
O vice-presidente da Ajufe, Ivanir César Ireno, protestou: “Sorrateira não, ministro. Sorrateira não. Democrática e transparente”.
Barbosa ficou irritado: “O senhor abaixe a voz que o senhor está na presidência do Supremo Tribunal Federal. Só me dirija a palavra quando eu lhe pedir.”
E continuou: “Como é que quase duplica o número de tribunais federais no Brasil dessa maneira? Os senhores não representam o Conselho Nacional de Justiça. Os senhores não representam o Superior Tribunal de Justiça, representam seus interesses corporativos legítimos. Mais isso não supre a vontade dos órgãos estatais. Os senhores são representantes de classe. Só isso”.
Barbosa também pediu que as associações não fossem à imprensa reclamar de sua gestão, mas que encaminhassem um ofício a ele. Recentemente, o ministro disse que os juízes têm mentalidade em prol da impunidade, e que havia um conluio entre juízes e advogados. As associações divulgaram notas criticando Barbosa.
“Quando vocês tiverem algo para acrescentar e aprimorar, antes de ir à imprensa, vocês dirijam um documento à minha assessoria e ao CNJ. Não vá á imprensa para criar clima desfavorável”.
O presidente da AMB, Nelson Calandra, protestou: “Pedimos audiência em dezembro”.
“Eu estou recebendo agora. Sou muito ocupado, não tenho tempo para receber associações todo dia. Recebi esse senhor não tem quatro meses”, rebateu Barbosa, apontando para o presidente da Ajufe, Nino Toldo. Quando Toldo informou seu nome a Barbosa, ouviu dele: “Não tenho a obrigação de saber o seu nome, lembro da sua fisionomia”.
O único momento de concordância foi quando as associações pediram apoio na reforma dos códigos. Calandra reclamou que as comissões do Congresso criadas para discutir os temas não têm juízes. Barbosa concordou:
“Sou favorável à total remodelagem das nossas leis arcaicas. Preocupo-me com o desequilíbrio nas comissões. São especialistas, mas não há preocupação de convidar magistrados e o Ministério Público. O resultado são leis capengas”.
Toldo disse que as associações procuraram o diálogo. “Contudo, o clima tenso da reunião mostra que esse diálogo não será fácil”, disse Toldo, segundo o site da Ajufe. (informações do jornal O Globo)